A arte de ensinar (e de aprender)

 



Existe uma universidade aqui em Fortaleza cujo slogan é "ensinando e aprendendo". Lembro-me que, ainda muito pequeno, esse foi um dos primeiros conceitos que aprendi sobre o que vem a ser a vida, esse eterno e grandioso ciclo dentro de ciclos. Ensinar e aprender, duas ações que se interseccionam e se confundem.
  Já entrando em minha adolescência, não tive dúvidas de que seguiria pelo caminho da educação, muito motivado que era por algo que me causava dor e estranhamento: o sentimento de não-pertença. Nunca me senti realmente parte da cultura desse povo da região do país que habito (nordeste), nunca consegui compartilhar dos pensamentos que fazem parte do senso-comum, nem de comportar-me como a maioria das pessoas (de qualquer parte). O que não significa dizer que eu era um eremita, ou algo que o valha; era, sim, um cara mais centrado em meus livros, mas que sempre teve uma língua afiada e uma mente perspicaz o suficiente para não deixar passar nada (e pagar o preço por isso, algo que ocorre ainda hoje).
    Falemos de hoje, então. Do hoje ainda não realizado, do hoje por constante realizar. Do inexequível e do exequível de se realizar.
      Ao tornar-me professor, assim como quem busca ser qualquer outra coisa, busquei realização. Se consegui? É como perguntar pra alguém com alguma criticidade diante da vida: Você é feliz? Sim e não. Há momentos felizes e momentos não felizes, como para tudo. Há dias em que a pressão sobe, o sangue ferve (e por vezes coalha) e dá vontade de ir fazer algo bem burocrático, não ter de levar trabalho pra casa, fazer algo que dure oito horas e só recomece, por mais oito horas, no dia seguinte. 
      Fazer essa opção, entretanto, é também optar por não ver crianças, adultos e adolescentes transformados pelo toque de Atena, deusa da sabedoria, não ver sorrisos, conflitos, dúvidas, aprendizados, e claro, ensinamentos. Ensinar, e ensinar a aprender, é um dom, é ser, você também professor, tocado pela mesma deusa que toca seus alunos. É vencer frustrações, má gestões, salários nem sempre condizentes com aquilo que se faz, ou o simples não-reconhecimento; assim como é também aliar-se e agregar boas ideias a bons gestores, trocar muitas ideias com colegas (e por vezes amigos) de trabalho, estudo constante, vencer egos, ser diplomático, não cair do salto.
     Acredito que o bom professor é consciente não apenas dessas, mas de muitas outras questões. O bom professor, o professor comprometido, é aquele ser humano que nunca está satisfeito, que nunca se satisfaz com o que sabe, que tem sede de conhecimento. E é também aquele que quebra barreiras, que se indaga sempre, e nunca deixa de proporcionar o mesmo sentimento aos alunos. 
       É com essa dimensão humana que se faz não apenas escola, mas cidadãos transformadores de sua própria realidade. Não há palavra mais bonita que sabedoria - porque esta vai para além do conhecimento cientificamente provável. Sabedoria é algo que o suplanta. E ainda bem que é assim, porque a vida seria bem menos digna sem os sábios. O mundo seria bem pior sem os constantes batalhadores nessa arte que é ensinar.
        Não há vida humana notável que não tenha sido tocada por algum tipo de bom ensinamento. É por isso que agarro essa profissão com seus braços capazes, e nela me faço homem, profissional, professor, aluno - e um eterno aprendiz.
COMPARTILHAR:

+1

5 Comentarios "A arte de ensinar (e de aprender)"

  1. Animador!!!! Ainda mais tendo em vista o que enfrentamos na rede pública aqui em SP!!!! Obrigada pelas palavras que reconfortam e iluminam, meu amigo!
    Um abraço!

    ResponderExcluir
  2. Parabéns por sua matéria. Vejo o quanto sua paixão pela leitura, que remonta à sua adolescência, contribuíram para sua crescente evolução literária, intelectual e humana.

    ResponderExcluir
  3. Olá!
    Recebi suas visitas em meu blog e estou aqui conferindo a tua página. Gostei muito do que você escreve, Marco. Parabéns. O meu marido também é professor (de filosofia) e eu, que já fui aluna de tantos outros bem sei das dores e delícias de ensinar. Aliás, todo professor já precisa nascer com o dom de saber ensinar. Acho que nossa Atena abençoa alguns de nós com isso.
    Voltarei aqui sempre, obrigadíssima, beijos!

    ResponderExcluir
  4. Parabéns,muito digina suas palavras fiquei muito emocionada.

    ResponderExcluir
  5. Obrigado pelas palavras à pessoa acima. Que bom que você encontrou nesse espaço uma fonte de alguma emoção. Volte sempre.

    ResponderExcluir