Axilas e Outras Histórias Indecorosas, de Rubem Fonseca

Axilas e Outras Histórias Indecorosas, de Rubem Fonseca



Confesso que não ia falar desse livro, porque um livro do Rubem Fonseca, a mim parece ser sempre um acontecimento desses que não importa o quanto eu gaste o meu francês, jamais conseguiria ser claro o suficiente pra dizer o que penso, além do fato de que dezenas de blogs vão falar mesmo do livro, então resolvi ficar de fora.

Só que, depois de conversar com alguns colegas e amigos sobre a obra do Rubão, alguns dele metendo o pau no cara, resolvi que precisava colocar meus dois centavos nessa história.

O grande lance é o seguinte: o que a galera parece não compreender, é que os anos de chumbo já passaram. Ficam querendo que, em pleno Brasil de 2011, o velho publique livros repletos de críticas, falando mal da ditadura vigente no país (né?), e grandes elucubrações filosóficas, o que nunca foi muito a do velho.

Rubão tá com 86 anos, e publica praticamente um livro por ano. Esse ano, publicou dois de uma vez só, inspirado talvez em Marisa Monte ou Maria Bethânia. O fato é que o assunto tem rendido.

As obsessões do velho estão todas lá: o culto profrano à mulher e suas formas, o sexo, a dor, o crime, a violência. Só que agora, realmente não tem mesmo o vigor daqueles livros clássicos, dos anos 70. E faz sentido. Fonseca sabe que o mundo mudou desde que ele começou a escrever, então certas coisas não fazem mais sentido, como aquela violência saída das favelas dispostas a exterminar todo mundo lá embaixo, logo agora, bem em épocas de UPPS em todo canto. 

O livro começa com a história de um cara que se lasca por causa de um par de sapatos. A história, por incrível que pareça para os padrões Fonsequianos, merece receber o seguinte adjetivo: é linda! Sim, isso mesmo que você leu. Curta, rápida, e um final simples, mas que me fez baixar o livro e ficar pensando em como ele tem razão. 

A partir daí, temos aqueles contos típicos dele pra chocar, como o da mãe que mata o filho com síndrome de Down, e outros que tratam exatamente das tais obsessões, e uns que estão lá pra aumentar o volume do livro e consequentemente, o preço.

Mas a verdade é que a máxima que o velho parece seguir nos últimos anos (Eu te dou um livro a cada ano, você se diverte e tem a sensação de que seu dinheiro foi bem gasto) continua a valer a pena. E a certeza que ele nos passa é que Axilas e Outras Histórias Indecorosas anda bem longe de ser seu canto do cisne.

Portanto, caros detratores, uma banana pra vocês que ficam criticando o livro sem ter lido. Ora bolas! Até a porcaria do Paulo Coelho eu li - duas "obras", daquelas que não descem na privada nem com um baldão de água! - pra dizer que não gosto; então, um autor que eu sei que gosto - nem que sejam das glórias do passado, vá lá - eu vou sair falando mal só porque o cara não escreve mais os clássicos? Ah vá. 

É, vá. Vá ler. Aí depois vocês falam. 

Resumindo: o livro é muito bom, diverte pra caramba. E você não precisa concordar com tudo o que ele escreve e afirma pra gostar do livro. Não é autoajuda, fellas. Não é Roberto Shinyashiki, nem Lair Ribeiro. Querem ler algo pra não se indignar, vocês cristãozinhos carolas? Pois vão ler a Bíblia, esse manual de maus costumes, como disse o sábio Saramago.  Ora, pitombas.


Esta Noite ou Nunca, de Marcos Rey

Esta Noite ou Nunca, de Marcos Rey

 



Desde que me entendo por gente, responsabilizo o Marcos Rey por me tornar o viciado em livros que sou hoje. Não tem jeito, foi realmente através dos livros dele que vim a amar a palavra escrita e o livro, com seus cheiros, formatos, tramas que me arrebatam. 

Descobri o Marcos através da série Vaga-lume, que me proporcionou grandes momentos de prazer, quando na pré-adolescência, me sentindo um estranho em terra estranha, eu recebia livros dessa série e ficava na cama descobrindo minha língua e autores maravilhosos. 

Até que um dia cresci e, nas minhas muitas correspondências com o Marcos, ele me disse, Por que você não lê um livro meu para adultos? Conselho recebido, pedido atendido. Na época, li um que ele tinha acabado de lançar: Os crimes do Olho-de-boi. Gamei. Daí pra descobrir que ele é muito melhor autor de livros pra adultos do que infanto-juvenis foi um salto (ou eu que teria crescido, não sei). Foi também nessa época que eu descobri autores franceses, alemães e russos, então imagine a loucura na cabeça da criança.

O certo é que, após a morte do Marcos, em 1999, e depois de uma breve passagem pela Companhia das Letras, Palma Donato, esposa do autor, entregou à editora Global a obra quase que inteira do marido. Confesso que, tirando as capas dos livros juvenis, que achei por demais abobalhadas, eles têm feito um trabalho fantástico com os livros pra adultos, imprimindo os livros num papel amarelado gostoso de ler, numa fonte ótima e capas de Victor Burton, tá bom pra você? Procuro ler um livro dele a cada ano, pra não faltar o que ler tão cedo do meu quase xará, e já que detonei todos os juvenis nessa época da vida, me restam os pra adultos, que vou dosando...

Pois bem, o livro que acabo de ler tem como título Esta noite ou nunca e, se não é dos clássicos do autor, como o são Memórias de um Gigolô, Café na Cama e O Enterro da Cafetina, sem dúvida é literatura brasileira que vale a pena o investimento. Sabe quando a praia por si só vale o mergulho? (Ou a piscina, a banheira, seja lá onde você goste de mergulhar). 

Esta noite ou nunca foi publicado em 1988, e tem ares autobiográficos. Conta a história de um homem que, com vocação pra escritor, torna-se autor de roteiros de pornochanchadas, gênero genuinamente brasileiro, que fez muito sucesso nos idos da década de 60 e 70 no cinema nacional. O quê autobiográfico reside no fato de que o próprio Marcos, antes de viver de literatura através dos livros que publicava na já mencionada Vaga-lume, era dos autores de pornochanchadas mais solicitados na paulicéia desvairada. 

O certo é que o narrador se mete em zilhões de confusões tanto com os caras com quem mora, como com a atriz que roda a maioria dos seus filmes, como com... enfim, todo mundo. As situações são hilárias, as sacadas do Marcos são de deixar o leitor com um sorriso na mente, e a trama é muito gostosa de ler. Às vezes me chateia o fato de hoje Marcos ter ficado meio obscurecido enquanto autor. Acho isso deveras uma m****. Se uma pessoa não aprender a gostar de ler através de um livro desses, pode enterrar. Não tem como não se afeiçoar aos personagens e seus descaminhos.

E para aqueles que já são apaixonados por literatura, e querem se dar ao trabalho de curtir ainda mais a literatura brasileira, leiam esse livro, e tudo mais que a Global vem publicando do Marcos Rey. Esta noite ou nunca é uma pedrada!