Remembering Whitney - a biografia de Whitney Houston, escrita por Cissy Houston, mãe da artista

Remembering Whitney - a biografia de Whitney Houston, escrita por Cissy Houston, mãe da artista


Ler uma biografia, bem ou mal escrita, é sempre um ato de profunda relação com o biografado. Afinal, ninguém lê um livro inteiro sobre a vida de quem não goste, ou não esteja inclinado a gostar ou a respeitar por um ou outro aspecto. Eu não leria uma biografia do Silas Malafaia, por exemplo. Ou desse pastor enrustidão que assumiu a presidência da Comissão dos Direitos Humanos, o tal do Marco Feliciano.

Assim, tão logo soube do lançamento do livro Remembering Whitney, escrito por sua mãe, Cissy Houston, que também é cantora (de música gospel), comprei-o rapidamente. Chame do que quiser, mas eu gostava e gosto muito da Whitney Houston. Ela embalou grandes momentos da minha vida. Suas músicas me fizeram querer cantar no banheiro (depois que eu saí da casa dos pais, claro), inspiraram muitas viagens - e tudo isso, naturalmente, não apenas meu, mas de uma legião de pessoas ao redor do mundo. 


O certo é que eu peguei o livro, que tem menos de 300 páginas de leitura mesmo (sem contar as informações de discografia e índice remissivo que vem ao final) e encarei rapidamente. 


A leitura é fácil, de modo que, se você estiver querendo treinar o seu Inglês, o livro é perfeito, e a narrativa da mãe da autora é bem linear - sem contar uma coisa ou outra. Começa com ela falando da vida dela própria, o que, segundo um psiquiatra que eu amo muito, disse que é importante saber da vida da mãe pra entender melhor a filha. Pois que seja. Você fica sabendo que ela cresceu numa família com uma penca de irmãos, que a mãe morreu cedo, o pai era super religioso e fez as filhas montarem um grupo pra cantar na missa. Só que o grupo cresceu e daqui a pouco estavam todos muito famosos. Uma espécie de Jackson Five gospel. O cara era bem linha-dura, criou as filhas sob o estalo do chicote e depois morreu. Acabou-se. E assim foi. 

O interessante nessa parte é que ela sempre fica fazendo paralelo com a vida que teria algum tempo depois, com Whitney e seus próprios filhos (três no total, e todos se envolveriam com drogas. Mas só a Whitney morreu. Até agora).

Dito isto, a biografia começa "de verdade". Você descobre que Whitney Houston era muito desejada, foi a caçula e, como reza a cantiga, criada como geralmente são os caçulas: no colo, livre de todo o Mal da face da Terra, amém. Claro que isso gerou problemas. Whitney - ou "Nippy", como ficamos sabendo que era o apelido da cantora e que sua mãe usa irritantemente no livro, o tempo inteiro, 100% das vezes que faz referência à filha - cresceu sem saber defender-se nem dizer não. Morria de medo de desagradar aos outros e, segundo a mãe, "só queria ser amada". Pois bem. Veja só como terminou, hein?

Então temos a ascensão da Whitney Houston artista. Saindo da igrejinha de Newark, onde começou a cantar com a mãe, depois fazendo backing vocal pra própria mãe e em seguida pra outros artistas, ainda no começo da casa dos vinte anos, a mãe resolve que ela está pronta pra "voar sozinha". 

Começa então a via crucis da cantora. O livro narra, sem grandes detalhes, o sucesso da filha, a influência de Clive Davis - o produtor musical que a descobriu - , como tudo começou com Bobby Brown, ex-marido da cantora (e que muita gente acha que foi quem a levou às drogas), a questão das drogas (sobre as quais ela jura não ter tido notícia durante muito tempo, apesar da melhor amiga da filha ter ido contar pessoalmente a ela. Ou seja: a mulher entrou em negação e por lá ficou), a separação, o reality show ao qual se submeteu pra agradar o marido, a confusão que teve com o pai já no final da vida dele, quando ele a processou por falta de pagamento (sim, ela empregava toda a família na empresa que criou pra gerenciar seus negócios).

Está tudo lá, ou quase. Ela não menciona, por exemplo, como a neta, Bobbi Kristina, que já tinha lá seus 13 anos na época em que a cantora estava mais afundada nas drogas, encarou tudo isso, já que vivia com um pai e uma mãe que não paravam de se agredir dentro de casa. Diz a autora, Cissy Houston, que vai deixar pra ela própria falar sobre o assunto, se ela quiser; abrindo espaço, lógico, pra que um belo dia ela resolva publicar seu próprio livro sobre a mãe e ganhar seu próprio dinheiro em cima da mãe também. Tudo certo. É digno. Mas ela não menciona, por exemplo, os fracassos da filha. O álbum Just Whitney, de 2002, não é sequer mencionado. Consta (não na biografia, claro) que foi um fiasco. Estranhamente, é o meu favorito, o único do qual sei todas as músicas e gosto de quase todas (exceto uma). Mas dele não se sabe nem se ouve sequer um pio. Frustração mode on. O que acontece é: ela vem narrando 1994, 95.... 97, fala do álbum My love is your love mais uma ou duas coisinhas e, de repente, estamos em 2004. Enfim, ela deve ter os motivos dela (ser mãe e querer defender a filha podem ser uma razão, mas eu não me conformo).

Até que chegamos ao final, com a notícia da morte, a festa pré-Grammy acontecendo lá embaixo enquanto o corpo da filha estava alguns andares acima, dentro de uma banheira, o que aconteceu nos dias subsequentes e o que ainda resta de tempo pra ela... 

Não vou contar aqui, naturalmente, o que ela achou do Clive Davis ter dado continuidade à festa, ou o que ela pensa de Bobby Brown, nem nenhuma dessas outras coisas. Isso fica pra quem for ler o livro. 

Se é uma produção caça-níquel? É, parcialmente. Acabou-se a fonte de renda, então, ela tem que render de alguma forma depois de morta. Entretanto, também acredito que serviu como catarse para a mãe, além de uma forma de manter a filha viva como ela gostaria que a filha fosse lembrada. 

Não é um livro magnificamente bem escrito, mas, como dito antes, é gostoso de ler. Para quem gosta da artista, para quem tem interesse em entender o que se passava com Whitney Houston, para quem, enfim, é um curioso de plantão, vale a pena. 

No fim das contas, foi uma bela homenagem da mãe, que soube unir o útil ao agradável.