Tendo feito anos bem recentemente, já perto de mais um final de ano, é inevitável deixar de pensar no que mudou, o que aconteceu nesse período que tenha me deixado mais ou menos feliz ou infeliz, saudável ou com necessidade de fazer algo por mim mesmo, com mais dinheiro ou menos dinheiro no banco.
É aí que se justifica a Danuza Leão dessa crônica. Quando eu era um pouco mais jovem, fuçava todo domingo a internet em busca da crônica dela daquela semana. Quando ela lançou o Quase Tudo, comprei imediatamente e devorei com vontade e lia regurgitando felicidade. Claro, não sou tão ingênuo. Não concordo com todas as opiniões dela, e sei que a moça é profundamente ligada a partidos nada sérios, como o PSDB que, associado a uma coisa ou outra que ela valorizava, me fazia ficar de orelha em pé.
Mas a leitura era fluida, o texto era gostoso e, além do mais, que mal fazia ler alguém com um ponto de vista diferente do meu? Aprendi que posso ter, sim, minha visão de mundo confrontada. Faz até bem, pra gente não se achar dono da verdade o tempo todo. Posso inclusive conviver bem com pessoas que têm visão política diferente da minha. Conheço quem inclusive se relacione afetivamente, de modo singular e plural, com pessoas de mundos completamente díspares. E não é que a Claire, da série A Sete Palmos terminou seus dias de vida ao lado de um cara com visão política super conservadora? Pois então. É possível na ficção e na realidade.
Ler Danuza Leão era divertido, um deleite, mesmo. Ficava ligeiramente amuado quando a crônica chegava ao fim e eu tinha de esperar todo um novo final de semana pra ler algo dela novamente.
Pulemos então para 2011. Comprei baratinho um livro dela carérrimo que sempre quis ler, uma coletânea de crônicas. Eu ia ter, só pra mim, 101 crônicas reunidas, não ia precisar esperar todas aquelas semanas pra lê-la, estavam todas ali!!! Resultado? Leitura chatérrima. Mal pude acreditar nas asneiras que li. Só que eu não cansei de apanhar aí.
Chegou-me às mãos o mais recente livro dela, É tudo tão simples, que me cativou pelo título. Será, pensei, que meu amor por ela seria redescoberto e eu finalmente iria ter prazer em lê-la como antes, um prazer daqueles, como um casal que faz amor depois de longa ausência do outro? Equívoco, equívoco!
Foi quando entendi que, realmente, nada passa despercebido pela ação dos dias. Que a autora mudou? Certamente. Ela mesma diz isso logo nas páginas iniciais do livro. Que mudou porque o mundo mudou, algo como mudei pra acompanhar o tempo. Certíssima. Triste daqueles que não o fazem. São massacrados pela vida, dizimados. Darwin já dizia isso, não tem novidade aí. Ou você se adapta, ou você já era. Acontece que, caminhando para a minha quarta década de vida, não dá pra ler conselhos do tipo: Se você passou dos quarenta e mora só, já que não tem empregada todo dia, facilite sua vida e aproveite pra manter uma boa silhueta. Para isso, seu jantar deve ser uma folha de alface pequena - uma só, bem frisado pela autora - e um copo d'água.
Eu até reli, achei que tinha alguma piada ali nas entrelinhas que eu não tinha entendido.
Não tem. É um conselho imbecil e fútil, de quem afirma no começo do livro que mudou mas, basta investigar um pouco mais adiante, e descobre-se que tem gente que gosta de se vestir com uma nova carapaça mas, retirada ela, fica a mesma velha pele de sempre. Tem jeito pra isso? Claro que tem, morrendo e nascendo de novo.
Claro que eu também mudei. Como homem e como leitor. Mas a verdade é que o que era divertido, passou a ser de uma futilidade que chega a ser uma ofensa.
É quando concluo que, ufa!, algumas mudanças são benéficas. Sempre é tempo de descobrir o que é importante de ser feito na vida e o que não, já que tempo pra fazer tudo jamais teremos. Quem tem essa ilusão certamente faz morada em hospício.
Se eu terminarei de ler o livro? Certamente. Quem nunca tentou voltar pra um ex-amor só pra depois descobrir que não dava mais certo mesmo que atire a primeira pedra. Sim, eu já descobri. Mas preciso ir até o fim, e ao virar a última página, virarei também a última pá de cal.
E vamos para o próximo, porque a vida segue. Sempre segue.