Indignação, de Philip Roth






Há tempos venho me cobrando falar de Philip Roth nesse espaço, e sempre adio porque nunca sei
exatamente qual abordagem deveria ter.

Foi quando me veio a ideia de fazer uma série de breves perfis literários, como o do post logo abaixo desse, e comecei pelo de uma escritora fascinante pela qual também sou apaixonado.

Mas não sou menos alucinado pelo Philip Roth, um dos atuais sérios candidatos ao prêmio Nobel de Literatura, e que também só vim a descobrir tardiamente em minha vida, por

"insistência" de uma outra escritora cujas crônicas adoro, a Martha Medeiros. Foi quando descobri um dos melhores autores que já li na vida.

Entretanto, não é dele que quero falar, e sim de sua primeira obra lida por mim.

Indignação (Companhia das Letras, 2009, 176 páginas), lida, primariamente, com a questão das escolhas que fazemos, ainda na juventude, que poderão dar o tom e a cor de diversos caminhos em nossas vidas. O que pode resultar em algo como tragédias gregas, como algo retirado dos trechos a seguir:


“Só é ditoso aquele que tem a consciência tranquila, e não é ferido pelos golpes da desgraça.” “Não consideremos feliz nenhum ser humano enquanto ele não tiver atingido, sem sofrer os golpes da fatalidade, o termo de sua vida.” “Não é lícito aos mortais evitar as desgraças que o destino lhes reserva.”

Os trechos acima têm algo em comum. Todos eles são falas que encerram tragédias gregas clássicas (Electra, Édipo-Rei e Antígona, pela ordem). São meio que lições finais que o autor das peças reservava para o público. Um ensinamento que podia se tirar de toda aquela desgraceira que havia ocorrido no palco. E lá iriam os atenienses para casa, depois do teatro, ruminando como eram as coisas da vida.

O romance pega emprestado o recurso de que os gregos tanto gostavam. Depois de contar a história de Marcus Messner, o autor resume tudo o que relatou com uma frase do gênero. “As escolhas mais banais, mais casuais, até cômicas de alguém podem gerar resultados desproporcionais.”

Marcus Messner, o garoto da história, na verdade, não tem nada de personagem de tragédia grega – exceto pela tragédia que vive. É apenas um menino recém-saído da adolescência e entrando na vida adulta. Filho de um açougueiro judeu de classe média, tenta levar uma vida menos dura do que a de seus pais. É o primeiro de sua família a conseguir ir para uma faculdade.

E, durante a maior parte do livro, a história que você lê é apenas essa: a de um garoto conhecendo a vida. Mas, o que você não sabe, ou pelo menos demora para se tocar, é que todos aqueles acontecimentos simples, quase banais, estão formando uma cadeia cada vez maior. E levando o personagem cada vez mais para perto da tragédia.

Irritado com o pai, o açougueiro, que é absolutamente paranoico com a segurança do menino, Marcus se muda de Nova Jérsei para Ohio. (Não fosse por isso, Marcus poderia ter se salvado, saberemos mais tarde.) Na nova universidade, conhece uma garota linda e, digamos, bastante desinibida. (Se isso não tivesse acontecido...) Por causa dela, Marcus briga com um colega de quarto e se muda (Se ele soubesse...) E assim por diante, até que, uma hora, a tragédia realmente acontece. E você, como um ateniense de 25 séculos atrás, larga o livro e fica ruminando a última frase que acabaram de lhe ensinar. Até os atos mais tolos podem gerar acontecimentos desproporcionais.

E esse talvez seja o grande mérito do livro de Roth. O livro realmente faz você pensar. De uma maneira sutil, no meio da história das descobertas sexuais e da indignação de um adolescente revoltado com a vida, vão surgindo temas para lá de importantes. Religião, guerra e família, só para citar três. E, em todos eles, Roth tem muito o que dizer.

Mas é como em uma tragédia grega. Se você quiser, dá para dispensar tudo isso. E aproveitar só a trama central. O rei que não sabia ter casado com a própria mãe. A moça que não pode enterrar o corpo do irmão. O matricídio cometido por Orestes. Ou, no caso de "Indignação", a vida de um adolescente tentando descobrir um mundo que o machuca. E também desse jeito a leitura é para lá de recomendada.

Seja lá como o leitor conseguir atingir o livro, abordá-lo (e ainda tem a possibilidade de ler o livro baseando-se pelo título, que poderia resultar em indigna nação, já que as coisas que acontecem a ele estão intrinsecamente ligadas à guerra, assim, pois, uma nação indigna que sujeita qualquer filho seu a atos de atrocidade que podem resultar em tragédia), é um livro que eu tenho enorme prazer de ter lido. Não é o melhor dos livros dele que li até agora, mas sem dúvida, um dos que merecem estar em nossa prateleira de livros lidos.

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1 Comentario "Indignação, de Philip Roth"

  1. Marco, meu amigo,
    Adorei sua resenha, muito interessante e que sem dúvida alguma está à altura da prosa enriquecedora de Roth. Aprendi mais com ela do que com qualquer outro texto sobre a obra desse autor fundamental.
    Já digo que virei aqui toda semana à espera de novos perfis...Quem será o próximo?
    Abração,
    Dri

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